[Analisando Mangás] Slam Dunk, volume 1
Panini publica primeiro volume do clássico mangá dos anos 90, com uma mistura de qualidade comum com edição de luxo
Lembro como se fosse ontem quando meu padrasto chegou com alguns
dvd's em casa. Geralmente ele surgia com algum filme interessante que acabara
de ser lançado, já que não tínhamos dinheiro para ir sempre no
cinema. Entretanto, diferente das outras vezes, o que ele trazia em mãos eram
desenhos animados - para ser mais exato, quatro: Naruto, Berserk, Claymore e
Slam Dunk. Eu devia ter meus 12 anos e rapidamente fiquei fascinado. O curioso é que, a maioria dos meus amigos que de algum jeito passaram a gostar
de animes, tiveram o primeiro contato somente com obras shounen, tipo Dragon
Ball e One Piece, concluindo por um bom tempo de suas vidas que só existia aquele tipo de anime e mangá. Para a minha sorte, logo no meu primeiro
contato conheci quatro obras completamente distintas. Eu não tinha ideia de
gênero e muito menos de classificação etária (onde já se viu uma criança
assistindo Berserk e Claymore?), apenas me divertia durante as tardes.
Sendo assim, posso
afirmar como Slam Dunk me marcou profundamente. Era engraçado ver aquele
topetudo de cabelo vermelho, Sakuragi, arrumando altas confusões enquanto
tentava impressionar a bela Haruko Akagi. Me divertia dando risada de piadas
que muitas vezes não entendia - aquele anime tinha tudo: apesar de ser uma
comédia, eu ficava vidrado acompanhando o desenrolar dos jogos e
consequentemente da vida amorosa de Sakuragi; hora torcia por ele, hora ficava
nervoso por suas trapalhadas fora de hora.
Por fim, como um
bom anime de esporte, Slam Dunk fez aquilo que poucos conseguem: me
influenciou a querer aprender. Na semana seguinte que ganhei aquele
dvd, adivinhem o que aconteceu? Comecei a jogar basquete. Eu não tinha os
cabelos vermelhos de Sakuragi, mas era bem alto para a minha idade e bom,
enquanto todo mundo só sabia falar de futebol (e eu era um zero a esquerda
nesse esporte), decidi aprender a jogar basquete. Meu objetivo? Fazer o famoso
Slam Dunk.
De fato, lembro de
ter me tornado relativamente bom. Passava a tarde inteira treinando com uma
cestinha improvisada no quintal e posteriormente, olhem só, até meus amigos
fissurados em futebol se interessaram e passamos a formar times para jogar.
Nunca consegui fazer o Slam Dunk e nem me tornei profissional ou coisa do tipo,
mas é revigorante pensar como uma simples obra, um simples anime, pode
influenciar tanto uma criança e criar boas memórias.
Portanto, ao pegar
o primeiro volume de Slam Dunk, lançado pela Planet Mangá (Panini), não era só
uma leitura casual, mas um reencontro, daqueles bem constrangedores. Por que
constrangedor? Por que eu cresci e Slam Dunk, sendo uma obra, não mudou, claro.
Então estaria eu, Maeister crescido, frente aquele mangá que marcou tanto a
minha infância. No meu guarda roupa, ainda estavam guardadas as edições em
papel jornal, totalmente amareladas, da Conrad. Fazia tanto tempo que se quer
lembrava de Sakuragi, que me peguei deveras ansioso: "a história é do
jeito que eu lembro mesmo? E essas lacunas aqui? Meu Deus, eu esqueci
completamente o que aconteceu nessa parte. Mas... será que de fato Slam Dunk é
tudo isso?"
Será? - A
perguntava ecoava em minha mente sem parar.
Felizmente, com grande prazer, posso afirmar: sim, Slam Dunk é tudo isso e muito mais!
História e arte
Suramu Danku, ou
simplesmente Slam Dunk, é um mangá lançado em 1990 na famosa Weekly Shounen
Jump. Na história, acompanhamos a trajetória de Hanamichi Sakuragi, um sujeito
engraçado, deveras nervoso com quase tudo, que ironicamente é um sensível
apaixonado.
É justamente desse
ponto que o enredo parte: depois de levar 50 foras (um novo recorde, de acordo
com seus "motivadores" amigos), Sakuragi conhece Haruko Akagi, uma
garota, assim como ele do primeiro ano, que ama basquete. Basta dois segundos
de conversa com a menina para o rapaz se sentir renovado e imediatamente se
tornar um atleta. Entretanto, ele percebe que as coisas não são tão fáceis e o
que seria apenas mais um caso qualquer (fogo de palha, novamente de acordo com
seus "motivadores" amigos), se torna o objetivo de sua vida.
Quem conhece a
obra, sabe o quão séria ela se torna posteriormente, mas sem nunca deixar de
lado a comédia. Deste modo, o humor é extremamente presente no primeiro
volume. É a comédia que denota o tom de tudo o que acontece; até nas partes
mais eletrizantes, sempre tem uma piada para te fazer rir. Diferente, por
exemplo, de One Punch Man que precisa criar um clima para finalmente dar o
punch hilário, Slam Dunk é totalmente casual, não existindo ordem para as
piadas acontecerem. Elas podem surgir uma atrás da outra, ou quando menos se
espera. É uma história de amor às avessas; uma sátira dos romances escolares e
talvez, até do próprio gênero esportivo.
Hanamichi não é
nenhum atleta, na verdade, ele se quer gosta de basquete. Seu foco inicial é
simplesmente impressionar a garota que ele gosta. Não existe um enredo definido
e sendo assim, o que sustenta são os personagens e suas interações; todos com
suas características peculiares, sejam visuais ou de personalidade.
Takehiko Inoue (o
autor) é genial, pois não se prende a arquétipos. Lógico, eles existem,
mas fica nítido como Inoue é talentoso - ele brinca, sem medo, com as atitudes de
cada um. Não demora para estarmos encantados e envolvidos apenas pelas
interações que ocorrem naquelas páginas. Geralmente uma obra, seja ela livro ou
filme, demora para nos cativar, enquanto os personagens vão se apresentando.
Isso é o que eu chamo de "existência ficcional". A existência
ficcional parte do princípio de que os personagens "andem com as próprias
pernas", existindo além da concepção do próprio autor - basta lembrarmos
de determinado carinha para sabermos como ele vai agir em determinada situação.
É aí que está a genialidade de Inoue - já nas primeiras páginas todos os
personagens existem! É como se estivéssemos acompanhando as aventuras de nossos
amigos; assistindo suas loucuras escolares, que mesmo em exagero, são
plausíveis de acordo com a vida real. Queremos ser amigos de Sakuragi; queremos
conhecer Haruko; queremos conhecer Rukawa; queremos conhecer Takenori; mas
acima de tudo, queremos jogar basquete.
Tenho muitas
teorias sobre criação de histórias, e em uma delas, os autores se dividem em
dois tipos: aqueles que te ganham pelo enredo em si, ou seja, dependem de
reviravoltas para te convencer; e aqueles que te ganham pela narrativa - basta
contarem qualquer história, que você irá acompanhar simplesmente pelo modo como aquilo é
contado, podendo ser até a coisa mais banal. Inoue está no segundo (e raro)
tipo. Eu poderia ficar horas e horas lendo apenas as trapalhadas de Hanamichi,
sem nenhum compromisso. Esse primeiro volume é assim mesmo, totalmente
descompromissado.
Porém, caso você não conheça Slam Dunk e esteja desconfiado, pode alegrar-se - existe
sim um enredo planejado e mais envolvente do que se imagina.
Outra coisa que
devo ressaltar é o fato das piadas serem atemporais. Slam Dunk é dos anos 90,
mas nem por isso deixa de dialogar com a atualidade. O humor funciona em todas
as épocas e para todas as idades - como podem perceber, eu mesmo fiz o teste.
Encarar essa segunda lida é uma redescoberta, pois diversas nuances que eu não entendia quando criança, algumas
maliciosas, pude compreender perfeitamente
e gargalhar mais ainda.
Sobre a arte, nem
sei o que dizer. Takehiko Inoue não é genial somente em criação de personagens,
mas no próprio desenho. Este é apenas o seu segundo mangá, mas fica nítido o
quão acima do padrão ele está, mesclando um traço realista de seinen, com o
visual típico do shounen dos anos 90 e com as distorções caricatas da comédia.
Assim como a história, é como se ele estivesse apenas brincando; se divertindo
em cada página; cada desenho e traço. Temos então um vislumbre realista de
como, de fato, é um time de basquete, seja no corpo dos jogadores ou no cenário
da quadra, e também suas representações hilárias. As feministas ficariam
loucas com as caricaturas de Takenori como macaco.
Sobre a edição da
Panini
É uma edição
ótima, no mesmo padrão de qualidade de One Punch Man e a um preço razoável
(apenas um real mais caro, 17,90. Mas facilmente você acha por 13 reais). Com 240 páginas, o mangá tem a gramatura
certa do papel Off-set, não sendo transparente demais (como algumas editoras
acabam fazendo ao trabalhar com esse papel). Mais uma vez, devo ressaltar como
orelhas mudam, e para melhor, o design de um quadrinho. É muito bom manusear
livremente o gibi e apreciar a arte. Minha avaliação da parte física é sempre tendo por base a minha mochila e tenho pra mim que os mangás se dividem em três
tipos: aqueles que preciso colocar em uma sacola, se não vão amassar
totalmente; aqueles que não preciso colocar em uma sacola, mas preciso ter
cuidado onde deixá-los, pois podem arranhar ou amassar dependendo de como forem
inseridos; e aqueles que não preciso me preocupar, pois são resistentes. Slam
Dunk está no último tipo.
A maior prova de
que a gramatura está afinadíssima, são as páginas coloridas. Páginas assim em
Off-set? Pode cancelar produção, pois vai vazar em todas as páginas
seguintes!
Bom, não é isso o
que acontece. As poucas páginas com cor são exuberantes e com a tonalidade
certa. Aliás, me admirei por terem resolvido publicar as páginas coloridas.
Se me lembro bem, a Conrad não fez isso. Mais um ponto pra Panini.
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A capa completa da nova edição. Para vê-la maior, basta clicar na imagem |
![]() |
A capa da antiga edição, da Conrad |
O visual da capa é
diferente da versão americana e japonesa normal, seguindo o formato kanzenban, que na verdade não é um kanzenban hahaha (este post do mais de oito mil explica essa treta direito). Isso é
ruim? Se a arte não fosse condizente, talvez fosse, mas o trabalho gráfico está
tão bom, que nem me importei. Chama até mais atenção, com a cara
do Hanamichi em foco de um lado, e o mesmo desenho, porém, com mais partes
do corpo do outro (e parte dele continuando nas orelhas). A fonte do nome é
simples, uma ótima escolha - sem firulas, nem exageros. Não vou entrar aqui no mérito se é certo ou não colocar como "kanzenban", apenas direi que dessa vez, quem sai ganhando dessa gambiarra ao melhor estilo miscigenação brasileira somos nós.
Conclusão
Não sei se estou
apto a avaliar totalmente, já que a nostalgia fala mais alto, mas Slam Dunk
vale cada centavo! A edição é um ótimo custo benefício, com um cuidado
merecido. Tanto quem é fã quanto quem não conhece, vai se deliciar com esse
primeiro volume, totalmente hilário. Não que a Conrad não tenha tentado, mas
era outra época e bom, talvez fosse o melhor que tinha. A Panini dessa vez deu
um cuidado atemporal para uma obra atemporal. Vamos ver como vai se sair nos
próximos volumes, mas desde já recomendo fortemente.
El Psy Congroo.
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